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"Vamos Falar": Machismo, você entende mesmo o que significa?

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Vivemos em uma sociedade considerada machista. Isso se manifesta em diversos problemas como a desigualdade de direitos entre homens e mulheres, altos índices de violência, assédio e estupro, objetificação da mulher, diferença salarial e muitos outros efeitos. Mas, afinal, você sabe o que é machismo? O que caracteriza uma pessoa machista? Como esse conceito afeta mulheres e homens? Quais são os dados sobre o assunto? Confira a explicação a seguir!

O que é machismo (ou uma pessoa machista)? 
O machismo é um preconceito, expresso por opiniões e atitudes, que se opõe à igualdade de direitos entre os gêneros, favorecendo o gênero masculino em detrimento ao feminino. Ou seja, é uma opressão, nas suas mais diversas formas, das mulheres feita pelos homens. Na prática, uma pessoa machista é aquela que acredita que homens e mulheres têm papéis distintos na sociedade, que a mulher não pode ou não deve se portar e ter os mesmos direitos de um homem ou que julga a mulher como inferior ao homem em aspectos físicos, intelectuais e sociais.

O pensamento machista é cultural e inerente aos diversos aspectos de uma sociedade, como a economia, a política, a religião, a família, a mídia, as artes, etc…Tendo sido normalizado por muito tempo, há apenas algumas décadas esse comportamento é problematizado, especialmente pelos movimentos feministas, que lutam pela igualdade de gênero, isto é, pela extinção da cultura machista nos diversos âmbitos da sociedade. Mas não é todo mundo que concorda que o machismo deve ser combatido, o que faz com que, apesar dos esforços feministas, ele ainda esteja presente em tantos ambientes.

Sociedade patriarcal 
Dentre os vários setores da sociedade em que o pensamento machista se faz presente, a família é um dos mais debatidos atualmente. Isso porque a maioria dos núcleos familiares, tanto dos países ocidentais quanto dos orientais, é estruturada colocando a figura do homem/pai em uma posição de superioridade e atribuindo a ele o papel de sustentar a casa, enquanto que a mulher é submissa à vontade masculina. Por mais que esse cenário esteja mudando e muitas famílias já não partilham desses pressupostos, a sociedade ainda é, em grande parte, patriarcal, ou seja, voltada para a figura do homem. Sabe-se que o machismo privilegia os homens em relação às mulheres, colocando-os em uma posição hierárquica superior. Porém, atitudes machistas nem sempre transparecem essa noção de hierarquia, especialmente quando são justificadas pela ideia de que as funções distintas entre mulheres e homens é algo natural, alegando que “diferente não significa pior”.

Por exemplo, uma ideia considerada machista em relação ao funcionamento de uma família é a de que a função inerente ao homem é consertar os problemas físicos de uma casa, já a da mulher é limpá-la e mantê-la organizada. Mesmo que limpar e organizar a casa não seja uma tarefa “pior” do que consertar algo quebrado, o fato de designar uma função para cada gênero, não dando a possibilidade de que a mulher opte por não ficar responsável pela limpeza – ou o homem opte por não ser responsável pelos consertos – é uma forma de limitar a liberdade de escolha desses indivíduos.

Além disso, a divisão de tarefas domésticas é desigual: para além de cuidar da casa, as mães geralmente são as responsáveis por cuidar dos filhos e educá-los. Tais responsabilidades – conhecidas como a dupla jornada de trabalho feminina – dificultam que as mulheres tenham o mesmo progresso que os homens dentro do ambiente profissional, pois não possuem a mesma disponibilidade de tempo para se dedicar à carreira.
Dados do IBGE mostram que, no Brasil, as mulheres dedicam em média quase 10 horas a mais por semana do que os homens no desempenho dos afazeres domésticos.

A consequência dessa realidade é mais homens em posições de chefia dentro das empresas e com maiores salários, contribuindo com a desigualdade de gênero. A essa questão, acrescenta-se a estereotipização de que homens são melhores líderes e a inferiorização das mulheres no ambiente de trabalho, o que também contribui para que as mulheres ainda representem apenas 2,8% dos cargos mais altos no Brasil, de acordo com o Grant Thornton, International Business Report (IBR) – Women in Business, e 74,5% do salário dos homens ocupando os mesmos cargos, segundo dados do World Economic Forum Annual Meeting, 2018 – Report.

A origem do patriarcalismo 
O conceito de família se consolidou enquanto instituição na Roma Antiga, se tornando a base da formação de toda estrutura social da humanidade. A família romana tinha o homem como líder e autoridade máxima sobre os membros da família, além dos escravos e vassalos. O poder era tanto que o patriarca tinha o direito até mesmo sobre a vida e a morte de sua esposa e filhos. A historiadora norte americana Joan Scott, que estuda a história das mulheres a partir da perspectiva de gênero, explica que o patriarcado é uma forma de organização social – que se estende para além da família -, em que as mulheres são subordinadas aos homens, e os jovens são subordinados aos homens mais velhos, os patriarcas da comunidade.

Esse patriarcalismo, caracterizado pela supremacia masculina, desvalorização da identidade feminina e atribuição da procriação como a principal função da mulher, tem raízes na Grécia Antiga, passando pela Idade Média e se perpetuando em diversas comunidades ao longo da história. Um exemplo é a cultura dos Vikings, da região da atual Escandinávia, em que o valor das mulheres era dado baseando-se na quantidade de filhos do sexo masculino. Isso mostra que, além do enaltecimento da figura masculina, o papel materno era central nas vidas das mulheres. Apesar da estrutura da família ter evoluído desde então, prevalece na sociedade atual – dentro e fora do ambiente familiar – o patriarcado contemporâneo, em que a relação do homem e da mulher continua desigual, mas em menor evidência do que nos períodos históricos anteriores.

O estereótipo feminino e masculino 
Um dos pilares de sustentação do machismo é a estereotipização do que é feminino e do que é masculino, ou seja, o que mulheres e homens devem ser e como devem agir de acordo com o seu gênero. Para entender esse conceito, é preciso antes distinguir gênero de sexo. Enquanto o termo sexo está ligado à composição cromossômica do indivíduo e ao tipo de aparelho reprodutor do indivíduo, o gênero abrange aspectos psicológicos e comportamentais, isto é, características psicossociais relativas a cada sexo. Isso significa que a identidade de gênero é a expectativa social que se tem do que o sexo masculino e feminino devem ser, por isso é uma distinção social e não biológica, como o sexo. É nesse sentido que surgem os estereótipos de gênero, um conjunto de crenças acerca dos atributos pessoais considerados adequados ao gênero feminino e masculino. Por exemplo, há um senso comum de que as mulheres naturalmente apresentam características emocionais como serem gentis, emotivas, compreensivas, indecisas e dedicadas; já os homens são considerados competitivos, independentes, decididos e agressivos.

Esses são os estereótipos de cada gênero, que não correspondem a uma predisposição biológica e natural, mas a um condicionamento social. Inclusive, não é raro que esses estereótipos não representem a realidade de muitos indivíduos, uma vez que a personalidade e as atitudes de cada pessoa não são determinadas apenas pelo seu sexo ou gênero, mas também por vontades pessoais e pressões sociais.

Mulheres podem ser machistas?
Ser machista, isto é, compartilhar do pressuposto de que homens devem possuir privilégios em relação às mulheres, não é um pensamento exclusivamente masculino. Por se tratar de uma crença enraizada na cultura da sociedade, crianças são ensinadas desde cedo os diferentes papéis que homens e mulheres podem desempenhar, fazendo com que, ao crescerem, ambos os sexos perpetuem essa ideia. Dessa forma, as mulheres não estão imunes a reproduzir e perpetuar um machismo estrutural.

Um exemplo disso é quando mães ensinam suas filhas a ficarem em casa e ajudarem a arrumar a casa, enquanto deixam seus filhos nas ruas brincando, ou quando mulheres criticam outras mulheres por terem uma liberdade sexual, mas naturalizam esse mesmo comportamento nos homens. Percebe-se então uma desigualdade de tratamento e de direitos entre os gêneros, característica fundamental do machismo.

O machismo também afeta os homens? 
O patriarcalismo e o machismo não afetam os homens da mesma forma que o faz com as mulheres, pois não os sub julgam, não os oprimem e não os excluem socialmente. Não é comum, por exemplo, ver homens sendo vítima de assédio, de objetificação ou mesmo perdendo uma oportunidade de emprego por conta de seu gênero, como acontece com as mulheres. Contudo, esse comportamento pode prejudicar eles também, devido a um conceito conhecido popularmente como “masculinidade tóxica“. O termo crítico remete ao senso comum de que os homens precisam ser caracterizados pela virilidade, força, poder, agressividade e sexualidade, excluindo qualquer possibilidade de demonstração de vulnerabilidade ou outras características do estereótipo feminino.

Isso acontece porque condutas tidas como femininas são atacadas em qualquer uma de suas expressões, mesmo quando vêm de homens. Por isso, a maioria dos meninos é criada de forma a não apresentar características do ideal feminino, como brincar de bonecas, ser sensível, chorar, se cuidar e ser vaidoso.

Uma consequência desse tipo de aprendizado é que os homens crescem entendendo que se cuidar deve ser uma preocupação feminina. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que a expectativa de vida dos homens é inferior à das mulheres – a média é de 73,8 anos para elas, contra 69,1 para eles. No Brasil, a discrepância é ainda maior: as mulheres vivem em média 79,1 anos, enquanto os homens vivem 71,9 anos. Marcia Regina Cominetti, do Laboratório de Biologia do Envelhecimento da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), atribui a esses números algumas razões, sendo uma delas – mas não a única – o fato das mulheres cuidarem mais da própria saúde: “elas fumam menos, bebem menos, trabalham em serviços menos pesados e se tratam mais do que os homens”.

Uma pesquisa realizada pela ONU Mulheres em parceria com o site Papo de Homem e o Grupo Boticário, feita em 2016, com mais de 20 mil brasileiros, revelou que 81% dos homens gostariam de cuidar melhor da própria saúde. Guilherme Valadares, fundador e diretor de conteúdo do Papo de Homem, contextualiza que “assim como o machismo é prejudicial às mulheres e aos próprios homens, a igualdade de gênero é benéfica para todos. Envolver os homens nesse movimento, sempre respeitando o protagonismo das mulheres, se faz então necessário”.

Outra imposição social é a de que homens não devem demonstrar os seus sentimentos e fraquezas, nem pedir ajuda, pois essas são “atitudes de mulher”. Essa repressão de tristezas é um dos motivos pelos quais os homens têm uma taxa de suicídio significativamente maior do que a das mulheres. No Brasil, eles se suicidam 4 vezes mais do que elas, de acordo com o Mapa da Violência Flasco Brasil. A brutalidade é outra característica proveniente de um ideal machista. Nesse sentido, o Atlas da Violência, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostra que 92% das mortes violentas ocorridas em 2016 no Brasil são de homens. Outra pesquisa, que analisou as mortes com autoria identificada em 5 cidades brasileiras no ano de 2013, para o estudo “Mensurando o Tempo do Processo de Homicídio Doloso em Cinco Capitais“, mostra que o perfil dos autores dos homicídios também é masculino.

Contudo, a agressão não se limita a homens contra homens. Segundo a OMS, o Brasil é o quinto país com a maior taxa de feminicídios, quando mulheres são assassinadas pelos homens por conta de sua condição feminina. Indo além, o machismo se estende de tal forma que influencia condutas homofóbicas, sendo comum ouvir termos como “mulherzinha” ou “mocinha” em referência pejorativa à homens homossexuais ou até à heterossexuais que se aproximam, mesmo que de forma sutil, a estereótipos femininos, considerados inferiores em relação aos masculinos. Ou seja, o raciocínio implícito na homofobia contra homens se deve, em partes, por uma questão oriunda do machismo.

Machismo x sexismo x misoginia 
O machismo é uma forma de sexismo, isto é, uma atitude de descriminação baseada no sexo ou gênero de uma pessoa. Isso significa que o sexismo pode afetar qualquer gênero e sexo, mas, historicamente, não se tem documentação de que já tenham existido sociedades sexistas com opressão do sexo masculino. Já a diferença entre machismo e misoginia é mais sutil. Este último refere-se a um sentimento de ódio e desprezo à mulher. Se distingue do machismo por envolver um forte conteúdo emocional à base de repulsa e aversão e se manifesta nas sociedades patriarcais por meio diferentes formas de violência contra as mulheres, como o assédio (moral, verbal e sexual), a violência sexual e doméstica e o feminicídio. Para a neurocientista e filósofa Berit Brogaard, misoginia não é simplesmente odiar mulheres, mas odiar mulheres que não se comportam da maneira esperada pela pessoa que a descrimina.

Machismo x feminismo
Por ter como objetivo o combate ao machismo na sociedade, muitas pessoas têm a ideia errônea de que feminismo é o oposto do machismo no sentido de que feministas almejam uma sociedade onde as mulheres oprimem os homens. Na realidade, porém, o feminismo é um movimento social, político e ideológico que visa uma sociedade com igualdade de direitos entre os gêneros. Por isso, entende-se que o objetivo feminista, acabar com o machismo e promover a igualdade de gênero, é benéfico tanto para mulher quanto para homens. Para compreender melhor o conceito do feminismo.

Por Isabela Moya
E graduanda de Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Fonte: https://www.politize.com.br/o-que-e-machismo/

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